quinta-feira, 22 de março de 2007

Mau tempo para a juventude



Em vez de brincar no bosque com os companheiros
meu filho se debruça sobre livros
E lê de preferência
sobre as negociatas dos financistas
E as carnificinas dos generais.
Quando lê que nossas leis
Proíbem aos pobres e aos ricos
Dormir sobre pontes
ouço sua risada divertida.
Quando descobre que o autor de um livro foi subornado
ilumina-se seu rosto jovem. Eu aprovo isso.
Mas gostaria de poder lhe oferecer
uma juventude em que ele
fosse brincar no bosque com os companheiros.

Bertlod Brecht
poeta e dramaturgo alemão.


Incrível lermos coisas 'antigas' tão atuais para nossa época, se Brecht não foi metafórico em algumas frases, podemos ser e aplicá-las claramente ao nosso contexto. Um poeta é sempre tão atual quanto um jornal diário, basta que tenhamos um olhar delicado e aguçado para compreendermos suas palavras que alguns teimam em chamar "descontextualizadas".

Agora, porque um mau tempo? Hoje, diferentemente do narrado pelo poema, o que acontece não é exatamente a indiferença pelos seres humanos, mas pelas idéias em si. Pra quem assistiu V de Vingança a `piração` será clara. O valor de uma idéia.

"Os homens morrem, mas as idéias não morrem jamais, eu sou uma idéia".

Essa é uma das mais belas e coerentes frases `declamadas`pelo vingador com a máscara mais interessante que eu já vi, com aquela expressão cínica que ao mesmo tempo que caçoa, passa uma sensação de dor constante.
O filme que lembra muito o livro de George Orwell, 1984, trata de um governo que manipula, e de pessoas que se acostumaram tanto a viver em um regime opressor que se sentem à vontade. Interessante é ficarmos na dúvida quando questionados sobre o fato de vivermos ou não isso de uma forma ou de outra...

Se hoje o governo não comete carnificinas, até que as esconde muito bem atrás de nomes como `polícia federal`, `polícia tática` e `batalhão de choque`. Mas o maior problema não é o físicos, e sim, a questão da estagnação de idéias, aquelas mesmas que nunca morreriam. Ninguém questiona polícias ou facções, que seja. Nem sequer cobram das autoridades ação, as autoridades eleitas por nós mesmos por voto direto e legítimo.

Muitas das idéias até continuam vivas, moribundas, mas vivas. Já que não morrem, as vezes se escondem como velhos teimosos em suas camas... um cérebro qualquer.
A entidade idéia hoje, está adormecida, ou acordada no peito de tão poucos que o barulho mínimo a ser feito soa como um zumbido de abelha, abelha estapeada pela bombas de efeito moral, vide manifestações pelo mundo a fora...

O que eu quero explicitar dentro de Brecht e V, é a questão de que, as pessoas que sofriam e liam os poemas do autor viviam a plena exposição/imposição de idéias, o questionamento e a compreensão dos problemas. Em `V de Vinganca` temos alguém que relembra a importância de uma idéia e tenta livrar o público do grande cabresto colocado pelo sistema.

Não temos um contexto político em que raciocinamos, não discutimos com tanto afinco as idéias expostas por aí,inclusive morremos de medo de discutir, e não temos ainda alguém que queira reavivar idéias antigas e percepções ignoradas pela massa.
Mas a forma como lidamos com as coisas não faz os problemas desaparecerem, e as ideias antigas sao atuais e encontram contexto para serem aplicadas.
Onde está nosso V?

Mau tempo não só para a juventude Brecht, mas para qualquer ser pensante que resolva questionar, bem vindo a estagnação-intelectual moderna do homem médio, à grande morfina que entorpece nossas discussões. Todo o jogo, agradece nossa falta de compreensão, participação e senso crítico.

5 comentários:

Silvia Song disse...

Querer comentar é uma coisa muito difícil quando um monte de coisas passam pela sua cabeça.

Aqui, eu sei que você sabe que eu passei...que eu li...e que isso sim, impregnou na minha mente.

Se você sabe já me basta.

Não preciso nem completar a frase, né "j"?!

Beijo!

Bianca Hayashi disse...

Hum, mais um filme pra minha lista de "filmes a serem vistos".

As pessoas têm medo de dar uma opinião. Preferem muitas vezes ficar apenas no senso comum; nunca têm coragem de dizer o que realmente pensam.

Isso quando pensam.

Beijos!

RDS disse...

Remember, remember, the rebel groups out of members...
Acho que é mais ou menos isso. Temos rebeldes sem grupos, e grupos rebeldes sem membros.
As idéias não foram apagadas, foram suprimidas, e não por uma força maior a não ser a da indiferença, encontraram o plano perfeito para acabar com os incômodos: fazer com que se preocupem apenas com uma forma de subsistência e ignoram as revoluções. Dão algumas pancadas pra ninguém falar de comodismo, mas virão as costas pra uma luta verdadeira, o inimigo está pulverizado, por isso que é difícil um revide.
Grande V, mas de Vanessa

Marina Gurgel disse...

Gostei muito desse filme também, Vã. Ele é forte, as relações ambíguas do persoagem, a menira como ele est´disposto a largar tudo em nome de uma idéia, esse desapego do V.
beijao

Michele Roza disse...

Entrei na lista dos que têm o filme em casa mas nunca o viram, até pq assim que assisitir certamente ele entrará para os melhores da minha coleção. De resto, já posso afirmar que a falta de discussão é interessante para a minoria que PODE(v. poder) manipular e desabona a inteligência daqueles que têm o DIREITO de questionar. Mas nem sempre querer é poder! Viva nossa democracia e boca no trambone!